domingo, 28 de abril de 2013

Machado de Assis - A Segunda Vida



Monsenhor Caldas interrompeu a narração do desconhecido: — Dá licença? é só um instante. Levantou-se, foi ao interior da casa, chamou o preto velho que o servia, e disse-lhe em voz baixa: — João, vai ali à estação de urbanos, fala da minha parte ao comandante, e pede-lhe que venha cá com um ou dois homens, para livrar-me de um sujeito doido. Anda, vai depressa.
E, voltando à sala: — Pronto, disse ele; podemos continuar.
— Como ia dizendo a Vossa Reverendíssima, morri no dia vinte de março de 1860, às cinco horas e quarenta e três minutos da manhã. Tinha então sessenta e oito anos de idade. Minha alma voou pelo espaço, até perder a terra de vista, deixando muito abaixo a lua, as estrelas e o sol; penetrou finalmente num espaço em que não havia mais nada, e era clareado tão-somente por uma luz difusa. Continuei a subir, e comecei a ver um pontinho mais luminoso ao longe, muito longe. O ponto cresceu, fez-se sol. Fui por ali dentro, sem arder, porque as almas são incombustíveis. A sua pegou fogo alguma vez? — Não, senhor.
— São incombustíveis. Fui subindo, subindo; na distância de quarenta mil léguas, ouvi uma deliciosa música, e logo que cheguei a cinco mil léguas, desceu um enxame de almas, que me levaram num palanquim feito de éter e plumas. Entrei daí a pouco no novo sol, que é o planeta dos virtuosos da terra. Não sou poeta, monsenhor; não ouso descrever-lhe as magnificências daquela estância divina. Poeta que fosse, não poderia, usando a linguagem humana, transmitir-lhe a emoção da grandeza, do deslumbramento, da felicidade, os êxtases, as melodias, os arrojos de luz e cores, uma coisa indefinível e incompreensível. Só vendo. Lá dentro é que soube que completava mais um milheiro de almas; tal era o motivo das festas extraordinárias que me fizeram, e que duraram dois séculos, ou, pelas nossas contas, quarenta e oito horas. Afinal, concluídas as festas, convidaram-me a tornar à terra para cumprir uma vida nova; era o privilégio de cada alma que completava um milheiro. Respondi agradecendo e recusando, mas não havia recusar.
Era uma lei eterna. A única liberdade que me deram foi a escolha do veículo; podia nascer príncipe ou condutor de ônibus. Que fazer? Que faria Vossa Reverendíssima no meu lugar? — Não posso saber; depende...
— Tem razão; depende das circunstâncias. Mas imagine que as minhas eram tais que não me davam gosto a tornar cá. Fui vítima da inexperiência, monsenhor, tive uma velhice ruim, por essa razão. Então lembrou-me que sempre ouvira dizer a meu pai e outras pessoas mais velhas, quando viam algum rapaz: — "Quem me dera aquela idade, sabendo o que sei hoje!" Lembrou-me isto, e declarei que me era indiferente nascer mendigo ou potentado, com a condição de nascer experiente. Não imagina o riso universal com que me ouviram. Jó, que ali preside a província dos pacientes, disse-me que um tal desejo era disparate; mas eu teimei e venci. Daí a pouco escorreguei no espaço: gastei nove meses a atravessá-lo até cair nos braços de uma ama de leite, e chamei-me José Maria. Vossa Reverendíssima é Romualdo, não? — Sim, senhor; Romualdo de Sousa Caldas.
— Será parente do padre Sousa Caldas? — Não, senhor.
— Bom poeta o padre Caldas. Poesia é um dom; eu nunca pude compor uma décima. Mas, vamos ao que importa. Conto-lhe primeiro o que me sucedeu; depois lhe direi o que desejo de Vossa Reverendíssima. Entretanto, se me permitisse ir fumando...
Monsenhor Caldas fez um gesto de assentimento, sem perder de vista a bengala que José Maria conservava atravessada sobre as pernas. Este preparou vagarosamente um cigarro. Era um homem de trinta e poucos anos, pálido, com um olhar ora mole e apagado, ora inquieto e centelhante. Apareceu ali, tinha o padre acabado de almoçar, e pediu-lhe uma entrevista para negócio grave e urgente. Monsenhor fê-lo entrar e sentar-se; no fim de dez minutos, viu que estava com um lunático. Perdoava-lhe a incoerência das idéias ou o assombroso das invenções; pode ser até que lhe servissem de estudo. Mas o desconhecido teve um assomo de raiva, que meteu medo ao pacato clérigo. Que podiam fazer ele e o preto, ambos velhos, contra qualquer agressão de um homem forte e louco? Enquanto esperava o auxilio policial, monsenhor Caldas desfazia-se em sorrisos e assentimentos de cabeça, espantava-se com ele, alegrava-se com ele, política útil com os loucos, as mulheres e os potentados. José Maria acendeu finalmente o cigarro, e continuou: — Renasci em cinco de janeiro de 1861. Não lhe digo nada da nova meninice, porque aí a experiência teve só uma forma instintiva. Mamava pouco; chorava o menos que podia para não apanhar pancada. Comecei a andar tarde, por medo de cair, e daí me ficou uma tal ou qual fraqueza nas pernas. Correr e rolar, trepar nas árvores, saltar paredões, trocar murros, coisas tão úteis, nada disso fiz, por medo de contusão e sangue. Para falar com franqueza, tive uma infância aborrecida, e a escola não o foi menos. Chamavam-me tolo e moleirão. Realmente, eu vivia fugindo de tudo. Creia que durante esse tempo não escorreguei, mas também não corria nunca. Palavra, foi um tempo de aborrecimento; e, comparando as cabeças quebradas de outro tempo com o tédio de hoje, antes as cabeças quebradas. Cresci; fiz-me rapaz, entrei no período dos amores... Não se assuste; serei casto, como a primeira ceia. Vossa Reverendíssima sabe o que é uma ceia de rapazes e mulheres? — Como quer que saiba?...
— Tinha dezenove anos, continuou José Maria, e não imagina o espanto dos meus amigos, quando me declarei pronto a ir a uma tal ceia... Ninguém esperava tal coisa de um rapaz tão cauteloso, que fugia de tudo, dos sonos atrasados, dos sonos excessivos, de andar sozinho a horas mortas, que vivia, por assim dizer, às apalpadelas. Fui à ceia; era no Jardim Botânico, obra esplêndida. Comidas, vinhos, luzes, flores, alegria dos rapazes, os olhos das damas, e, por cima de tudo, um apetite de vinte anos. Há de crer que não comi nada? A lembrança de três indigestões apanhadas quarenta anos antes, na primeira vida, fez-me recuar. Menti dizendo que estava indisposto. Uma das damas veio sentar-se à minha direita, para curar-me; outra levantou-se também, e veio para a minha esquerda, com o mesmo fim.
Você cura de um lado, eu curo do outro, disseram elas. Eram lépidas, frescas, astuciosas, e tinham fama de devorar o coração e a vida dos rapazes. Confesso-lhe que fiquei com medo e retraí-me. Elas fizeram tudo, tudo; mas em vão. Vim de lá de manhã, apaixonado por ambas, sem nenhuma delas, e caindo de fome. Que lhe parece? concluiu José Maria pondo as mãos nos joelhos, e arqueando os braços para fora.
— Com efeito...
— Não lhe digo mais nada; Vossa Reverendíssima adivinhará o resto. A minha segunda vida é assim uma mocidade expansiva e impetuosa, enfreada por uma experiência virtual e tradicional. Vivo como Eurico, atado ao próprio cadáver... Não, a comparação não é boa. Como lhe parece que vivo? — Sou pouco imaginoso. Suponho que vive assim como um pássaro, batendo as asas e amarrado pelos pés...
— Justamente. Pouco imaginoso? Achou a fórmula; é isso mesmo. Um pássaro, um grande pássaro, batendo as asas, assim...
José Maria ergueu-se, agitando os braços, à maneira de asas. Ao erguer-se, caiu-lhe a bengala no chão; mas ele não deu por ela. Continuou a agitar os braços, em pé, defronte do padre, e a dizer que era isso mesmo, um pássaro, um grande pássaro... De cada vez que batia os braços nas coxas, levantava os calcanhares, dando ao corpo uma cadência de movimentos, e conservava os pés unidos, para mostrar que os tinha amarrados. Monsenhor aprovava de cabeça; ao mesmo tempo afiava as orelhas para ver se ouvia passos na escada.
Tudo silêncio. Só lhe chegavam os rumores de fora: — carros e carroças que desciam, quitandeiras apregoando legumes, e um piano da vizinhança. José Maria sentou-se finalmente, depois de apanhar a bengala, e continuou nestes termos: — Um pássaro, um grande pássaro. Para ver quanto é feliz a comparação, basta a aventura que me traz aqui, um caso de consciência, uma paixão, uma mulher, uma viúva, D. Clemência. Tem vinte e seis anos, uns olhos que não acabam mais, não digo no tamanho, mas na expressão, e duas pinceladas de buço, que lhe completam a fisionomia. É filha de um professor jubilado. Os vestidos pretos ficam-lhe tão bem que eu às vezes digolhe rindo que ela não enviuvou senão para andar de luto. Caçoadas! Conhecemo-nos há um ano, em casa de um fazendeiro de Cantagalo. Saímos namorados um do outro. Já sei o que me vai perguntar: por que é que não nos casamos, sendo ambos livres...
— Sim, senhor.
— Mas, homem de Deus! é essa justamente a matéria da minha aventura. Somos livres, gostamos um do outro, e não nos casamos: tal é a situação tenebrosa que venho expor a Vossa Reverendíssima, e que a sua teologia ou o que quer que seja, explicará, se puder. Voltamos para a Corte namorados. Clemência morava com o velho pai, e um irmão empregado no comércio; relacionei-me com ambos, e comecei a freqüentar a casa, em Matacavalos. Olhos, apertos de mão, palavras soltas, outras ligadas, uma frase, duas frases, e estávamos amados e confessados. Uma noite, no patamar da escada, trocamos o primeiro beijo... Perdoe estas coisas, monsenhor; faça de conta que me está ouvindo de confissão.
Nem eu lhe digo isto senão para acrescentar que saí dali tonto, desvairado, com a imagem de Clemência na cabeça e o sabor do beijo na boca. Errei cerca de duas horas, planeando uma vida única; determinei pedir-lhe a mão no fim da semana, e casar daí a um mês.
Cheguei às derradeiras minúcias, cheguei a redigir e ornar de cabeça as cartas de participação. Entrei em casa depois de meia-noite, e toda essa fantasmagoria voou, como as mutações à vista nas antigas peças de teatro. Veja se adivinha como.
— Não alcanço...
— Considerei, no momento de despir o colete, que o amor podia acabar depressa; tem-se visto algumas vezes. Ao descalçar as botas, lembrou-me coisa pior: — podia ficar o fastio. Concluí a toilette de dormir, acendi um cigarro, e, reclinado no canapé, pensei que o costume, a convivência, podia salvar tudo; mas, logo depois adverti que as duas índoles podiam ser incompatíveis; e que fazer com duas índoles incompatíveis e inseparáveis? Mas, enfim, dei de barato tudo isso, porque a paixão era grande, violenta; considerei-me casado, com uma linda criancinha... Uma? duas, seis, oito; podiam vir oito, podiam vir dez; algumas aleijadas. Também podia vir uma crise, duas crises, falta de dinheiro, penúria, doenças; podia vir alguma dessas afeições espúrias que perturbam a paz doméstica...
Considerei tudo e concluí que o melhor era não casar. O que não lhe posso contar é o meu desespero; faltam-me expressões para lhe pintar o que padeci nessa noite... Deixa-me fumar outro cigarro? Não esperou resposta, fez o cigarro, e acendeu-o. Monsenhor não podia deixar de admirar-lhe a bela cabeça, no meio do desalinho próprio do estado; ao mesmo tempo notou que ele falava em termos polidos, e, que apesar dos rompantes mórbidos, tinha maneiras.
Quem diabo podia ser esse homem? José Maria continuou a história, dizendo que deixou de ir à casa de Clemência, durante seis dias, mas não resistiu às cartas e às lágrimas. No fim de uma semana correu para lá, e confessou-lhe tudo, tudo. Ela ouviu-o com muito interesse, e quis saber o que era preciso para acabar com tantas cismas, que prova de amor queria que ela lhe desse. — A resposta de José Maria foi uma pergunta.
— Está disposta a fazer-me um grande sacrifício? disse-lhe eu. Clemência jurou que sim. "Pois bem, rompa com tudo, família e sociedade; venha morar comigo; casamo-nos depois desse noviciado." Compreendo que Vossa Reverendíssima arregale os olhos. Os dela encheram-se de lágrimas; mas, apesar de humilhada, aceitou tudo. Vamos; confesse que sou um monstro.
— Não, senhor...
— Como não? Sou um monstro. Clemência veio para minha casa, e não imagina as festas com que a recebi. "Deixo tudo, disse-me ela; você é para mim o universo." Eu beijeilhe os pés, beijei-lhe os tacões dos sapatos. Não imagina o meu contentamento. No dia seguinte, recebi uma carta tarjada de preto; era a notícia da morte de um tio meu, em Santana do Livramento, deixando-me vinte mil contos. Fiquei fulminado. "Entendo, disse a Clemência, você sacrificou tudo, porque tinha notícia da herança." Desta vez, Clemência não chorou, pegou em si e saiu. Fui atrás dela, envergonhado, pedi-lhe perdão; ela resistiu.
Um dia, dois dias, três dias, foi tudo vão; Clemência não cedia nada, não falava sequer.
Então declarei-lhe que me mataria; comprei um revólver, fui ter com ela, e apresentei-lho: é este.
Monsenhor Caldas empalideceu. José Maria mostrou-lhe o revólver, durante alguns segundos, tornou a metê-lo na algibeira, e continuou: — Cheguei a dar um tiro. Ela, assustada, desarmou-me e perdoou-me. Ajustamos precipitar o casamento, e, pela minha parte, impus uma condição: doar os vinte mil contos à Biblioteca Nacional. Clemência atirou-se-me aos braços, e aprovou-me com um beijo. Dei os vinte mil contos. Há de ter lido nos jornais... Três semanas depois casamo-nos. Vossa Reverendíssima respira como quem chegou ao fim. Qual! Agora é que chegamos ao trágico. O que posso fazer é abreviar umas particularidades e suprimir outras; restrinjo-me a Clemência. Não lhe falo de outras emoções truncadas, que são todas as minhas, abortos de prazer, planos que se esgarçam no ar, nem das ilusões de saia rota, nem do tal pássaro...
plás... plás... plás...
E, de um salto, José Maria ficou outra vez de pé, agitando os braços, e dando ao corpo uma cadência. Monsenhor Caldas começou a suar frio. No fim de alguns segundos, José Maria parou, sentou-se, e reatou a narração, agora mais difusa, mais derramada, evidentemente mais delirante. Contava os sustos em que vivia, desgostos e desconfianças.
Não podia comer um figo às dentadas, como outrora; o receio do bicho diminuía-lhe o sabor. Não cria nas caras alegres da gente que ia pela rua: preocupações, desejos, ódios, tristezas, outras coisas, iam dissimuladas por umas três quartas partes delas. Vivia a temer um filho cego ou surdo-mudo, ou tuberculoso, ou assassino, etc. Não conseguia dar um jantar que não ficasse triste logo depois da sopa, pela idéia de que uma palavra sua, um gesto da mulher, qualquer falta de serviço podia sugerir o epigrama digestivo, na rua, debaixo de um lampião. A experiência dera-lhe o terror de ser empulhado. Confessava ao padre que, realmente, não tinha até agora lucrado nada; ao contrário, perdera até, porque fora levado ao sangue... Ia contar-lhe o caso do sangue. Na véspera, deitara-se cedo, e sonhou... Com quem pensava o padre que ele sonhou? — Não atino...
— Sonhei que o Diabo lia-me o Evangelho. Chegando ao ponto em que Jesus fala dos lírios do campo, o Diabo colheu alguns e deu-mos. "Toma, disse-me ele; são os lírios da Escritura; segundo ouviste, nem Salomão em toda a pompa, pode ombrear com eles.
Salomão é a sapiência. E sabes o que são estes lírios, José? São os teus vinte anos." Fitei-os encantado; eram lindos como não imagina. O Diabo pegou deles, cheirou-os e disse-me que os cheirasse também. Não lhe digo nada; no momento de os chegar ao nariz, vi sair de dentro um réptil fedorento e torpe, dei um grito, e arrojei para longe as flores. Então, o Diabo, escancarando uma formidável gargalhada: "José Maria, são os teus vinte anos." Era uma gargalhada assim: — cá, cá, cá, cá, cá...
José Maria ria à solta, ria de um modo estridente e diabólico. De repente, parou; levantou-se, e contou que, tão depressa abriu os olhos, como viu a mulher diante dele aflita e desgrenhada. Os olhos de Clemência eram doces, mas ele disse-lhe que os olhos doces também fazem mal. Ela arrojou-se-lhe aos pés... Neste ponto a fisionomia de José Maria estava tão transtornada que o padre, também de pé, começou a recuar, trêmulo e pálido.
"Não, miserável! não! tu não me fugirás!" bradava José Maria investindo para ele. Tinha os olhos esbugalhados, as têmporas latejantes; o padre ia recuando... recuando... Pela escada acima ouvia-se um rumor de espadas e de pés.
Fonte: www.dominiopublico.gov.br

Elizabeth Badinter in "XY, Sobre a Identidade Masculina"



“É tempo principalmente de fazer o elogio das virtudes masculinas que não se adquirem nem passiva, nem facilmente, mas que se afirmam em termos de esforços e exigências. Elas se chamam autodomínio, vontade de se superar, gosto pelo risco e o desafio e resistência à opressão....são as condições da criação mas também da dignidade. Pertencem a todo o ser humano da mesma forma que as virtudes femininas. Essas conservam o mundo aquelas fazem recuar os limites. Longe de serem incompatíveis elas são indissociáveis, para que se pretenda o título de humano. Embora uma tradição milenar as tenha colocado em oposição atribuindo-as a um ou a outro sexo tomamos pouco a pouco a consciência que umas sem as outras acabariam se tornando um pesadelo: o autodomínio pode tornar-se neurose, o gosto pelo risco tender ao suicídio  a resistência pode transformar-se em “agressão”. Inversamente as virtudes femininas tão celebradas nos dias de hoje podem, se não forem temperadas pelas masculinas, conduzir à passividade e à subordinação.”

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Confissões de um viciado arrependido


Drauzio Varella

"Larguei de fumar há mais de 20 anos. Hoje a fumaça me incomoda. Odeio comer no meio da fumaça. Se o lugar está cheio de fumantes, os olhos me ardem e, quando volto para casa, ponho a camisa para lavar e penduro a calça no banheiro para não impregnar o armário.
Minha inimizade com a nicotina, droga covarde, acontece no plano social e no pessoal.
Em trinta anos de cancerologia, perdi a conta de quantos vi morrer só porque fumavam. No ano passado, morreram 200 mil pessoas por causa do cigarro no Brasil. É uma epidemia. Matou mais gente do que a Aids somada a todas as outras doenças infecciosas e às mortes por acidentes e violência urbana!
No plano puramente pessoal, a inimizade é até maior. Maltratei meu corpo com cancerígenos de ação lenta durante dezenove anos. Mais grave ainda, o cigarro matou meu pai, um irmão alto e bonito aos 45 anos e um sogro querido.
Apesar de toda a motivação pessoal, se quiser ser honesto, devo confessar que ainda sonho com o cigarro. Sonho que estou fumando e sinto uma decepção horrível: “Que idiota, voltei a fumar!”. Então, acordo.
Quando larguei, era muito pior. Chegava a sonhar com essa cena duas vezes na mesma noite. Depois, foi espaçando; agora, a última vez que aconteceu foi antes do Natal.
Foi no dia em que, ao atravessar a porta de saída do hospital, fui invadido por uma sensação de felicidade repentina. Na hora, achei que era a luminosidade da manhã e a brisa fresca, mas logo percebi o engano: era o cheiro do cigarro das pessoas que vinham fumar do lado de fora. É muita humilhação para um viciado arrependido! Depois de vinte anos, o idiota ainda baba quando é pego desarmado diante da droga. Na mesma noite, voltou o sonho. Fazia seis meses que ele não vinha.
Parece que meu caso não é único. Muitos ex-fumantes relatam sonho idêntico. A aparição é tão constante que deve representar um dos sintomas crônicos da abstinência.
A nicotina age no cérebro e altera o metabolismo dos neurônios. É a droga mais difícil de largar. Proíbo um adolescente com tuberculose de jogar fumaça nos pulmões. Ele entende, abandona a maconha, o crack, mas o cigarro não: “Pô, é mais difícil do que o crack, doutor”.
Não ouvi isso duas ou três vezes. De tanto ter ouvido e nunca escutado o contrário, acabei convencido do valor estatístico da observação. A nicotina provoca uma doença crônica, recidivante.
Por isso ninguém tem o direito de julgar moralmente um fumante. Defendermo-nos da fumaça deles é uma coisa, dever de todos, mas considerá-los pessoas pusilânimes só porque fumam é demonstração de ignorância da ação farmacológica da nicotina.
Todo mundo que fuma — até os que dizem “fumo mesmo, e daí?” –, qualquer um, sem exceção, largaria imediatamente se isso não lhe trouxesse sofrimento. Que ser humano encontra prazer na escravidão? Quem gosta de andar com hálito de cinzeiro, com a pele sem vitalidade, com o fôlego curto e de correr o risco de ficar impotente ou de ter um ataque cardíaco no almoço de domingo?
Não vamos nos iludir, o fumante só não larga o cigarro por uma razão: não consegue. Não encontra forças para vencer a dependência. A síndrome de abstinência da droga desnorteia o coitado. Quando ela vem, a vida veste seu manto cinzento, e o corpo entra numa agitação crescente, inexorável. Só quem já passou por isso sabe o que é.
Então basta a primeira tragada, e a felicidade torna-se possível outra vez. Mas por pouco tempo. Menos de uma hora depois, a abstinência cruza os braços à soleira da porta: “Vai fumar já ou quer que espere?”. O dia inteiro nesse tormento, a vontade do usuário curva-se à abstinência como o marido diante da mulher enfezada: “Melhor fazer logo antes que ela fique nervosa”.
A nicotina é vil, persistente, derrota pelo cansaço. Em poucos dias, faz o principiante virar cachorro manso. Daí em diante, é um maço por dia. Todo santo dia, sessenta milhões de mulheres e homens no Brasil inteiro, pelo resto de suas vidas, molham a mão do fornecedor.
Para comemorar o Dia Internacional de Combate ao Fumo, o Ministério da Saúde vai obrigar os fabricantes a estampar nos maços figuras que lembrem ao fumante as consequências do fumo, medida adotada com sucesso em outros países. Apesar de necessária, no entanto, a consciência dos malefícios de uma droga não é condição suficiente para acabar com a dependência dela.
Para tanto, você, fumante, precisa de determinação. Se não confia na força de vontade para parar de uma vez, pelo menos tente diminuir a dose. É lógico que dá! Não venha com aquela conversa de que agora não é possível porque anda meio nervoso. Ninguém perde o juízo se não fumar 20 ou 30 cigarros por dia. Dez não está bom para começar? Dez fazem menos mal e é mais do que suficiente para aplacar as crises mais torturantes.
Diminuir o cigarro sempre é possível. Mesmo que numa noite desvairada você enfie o pé na jaca e fume dois maços, a ressaca do dia seguinte vai ajudá-lo a segurar outra vez.
Depois de ter feito isso, experimente parar um dia inteiro, só para ver como é. Calma, é um dia só, no outro você volta aos dez. Ou, talvez, um pouco menos, quem sabe. Custa experimentar? Afinal, um mínimo de brio ainda lhe resta. Vai morrer sem tentar?"

quarta-feira, 24 de abril de 2013

A outra noite - Rubem Braga



Outro dia fui a São Paulo e resolvi voltar à noite, uma noite de vento sul e chuva, tanto lá como aqui. Quando vinha para casa de táxi, encontrei um amigo e o trouxe até Copacabana; e contei a ele que lá em cima, além das nuvens, estava um luar lindo, de lua cheia; e que as nuvens feias que cobriam a cidade eram, vistas de cima, enluaradas, colchões de sonho, alvas, uma paisagem irreal.

Depois que o meu amigo desceu do carro, o chofer aproveitou o sinal fechado para voltar-se para mim:

-O senhor vai desculpar, eu estava aqui a ouvir sua conversa. Mas, tem mesmo luar lá em cima?

Confirmei: sim, acima da nossa noite preta e enlamaçada e torpe havia uma outra - pura, perfeita e linda.

-Mas, que coisa...

Ele chegou a pôr a cabeça fora do carro para olhar o céu fechado de chuva. Depois continuou guiando mais lentamente. Não sei se sonhava em ser aviador ou pensava em outra coisa.

-Ora, sim senhor...

E, quando saltei e paguei a corrida, ele me disse um "boa noite" e um "muito obrigado ao senhor" tão sinceros, tão veementes, como se eu lhe tivesse feito um presente de rei.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

51. De como temos que optar entre a lamentação e o amor




Do conto Campo Geral, do livro Manuelzão e Miguilim.



“- Miguilim, você tem medo de morrer?
- Demais... Dito, eu tenho um medo, mas só se fosse sozinho. Queria a gente todos morresse juntos...
- Eu tenho. Não queria ir para o céu menino pequeno.”

A estória de Dito e Miguilim narra a vida de uma família isolada num interior muito distante de tudo, sob a ótica dos dois pequenos irmãos. É uma estória linda sobre a infância, os temores, o pasmo olhar infantil diante do mundo adulto, as descobertas, o sofrimento.  

A certa altura do conto Dito – o irmão menor – corta o pé ao pisar num caco. O corte se infecciona e o menino piora. É o tétano se instalando. E Dito chama seu irmão.

“Uma hora Dito chamou Miguilim, queria ficar com Miguilim sozinho. Quase que ele não podia mais falar. –‘Miguilim, e você não contou a estória da Cuca pingo-de-Ouro...’ –‘Mas eu não posso, Dito, mesmo não posso! Eu gosto demais dela, estes dias todos...’ Como é que podia inventar estória? Miguilim soluçava. –‘Faz mal não, Miguilim, mesmo ceguinha mesmo, ela há de me reconhecer...’ –‘No Céu, Dito? No Céu?!’ – e Miguilim desengolia da garganta um desespero. –‘Chora não, Miguilim, de quem eu gosto mais, junto com Mãe, é de você...’ E o Dito também não conseguia mais falar direito, os dentes dele teimavam em ficar encostados, a boca mal abria, mas mesmo assim ele forcejou e disse tudo: – ‘Miguilim, Miguilim, eu vou ensinar o que agorinha eu sei, demais: é que a gente pode ficar sempre alegre, alegre, mesmo com toda coisa ruim que acontece acontecendo. A gente deve de poder então ficar mais alegre, mais alegre, por dentro!’ ”

Um amigo disse-me um dia de suas duas avós, com vidas praticamente idênticas e posturas radicalmente diferentes.

As duas eram de origem muito humilde, casaram-se muito jovens, tiveram o mesmo número de filhos, os dois maridos se tornaram alcoólatras e agressivos, as duas apanhavam muito, as duas ficaram viúvas mais ou menos com a mesma idade e terminaram de criar seus filhos sozinhas, da mesma forma, como costureiras.

As duas agora eram agora amparadas pelos seus filhos, que estudaram e se estruturaram na vida.

Mas as semelhanças paravam aí. Uma delas era absolutamente envolvida com a vida, alegre, feliz. Sabia-se idosa e sofria dos problemas da idade, mas sem que isso abatesse seu gosto em viver.

A outra de tudo se queixava, nada estava bom, permanentemente estava mal humorada, era muito hostil com todos e se sentia absolutamente injustiçada. Enfim, estava afundada na própria lamentação.

Como era possível duas pessoas com histórias tão semelhantes e tão distintas?

E Dito dizendo que podemos ser felizes mesmo com coisas ruins acontecendo.

A lamentação é uma cachaça extremamente embriagante. Uma vez engolida vamos afundando nela de tal forma que muitos não conseguem mais se reerguer. A dor tem seu feitiço, como tão bem expresso por Paulo Mendes Campos:

“Por fim, mais uma palavra de bolso: às vezes uma pessoa se abandona de tal forma ao sofrimento, com uma tal complacência, que tem medo de não poder sair de lá. A dor também tem o seu feitiço, e este se vira contra o enfeitiçado. Por isso, Alice, depois de ter chorado um lago, pensava: “Agora serei castigada, afogando-me em minhas próprias lágrimas”.

Conclusão: a própria dor deve ter a sua medida: É feio, é imodesto, é vão, é perigoso ultrapassar a fronteira de nossa dor, Maria da Graça.”

É perigoso ultrapassar a fronteira da própria dor. E é necessário saber que muitas vezes temos que escolher por qual caminho irá: o da lamentação que justifica todo nosso rancor ou o de se tentar tocar algum possível que se apresenta diante de nós, como chance de felicidade, como chance de amor.

O personagem Antonio, do livro "Arroz de Palma", de Francisco Azevedo, diz algo a respeito na passagem abaixo.

"Quando penso que acabou, Sebastião ainda me cutuca a lembrança e me confidencia que não acredita em nada disso de pobre, rico, feio e bonito, mau e bom...para ele, só existem dois tipos de pessoas no mundo: as que reclamam e as que agradecem".

No filme “Hiroxima, meu amor” a personagem principal, ao rememorar o enorme sofrimento que sentiu durante sua adolescência, na segunda grande guerra, vai se afundando de tal forma na dor e no desespero que o seu namorado, também muito bem provido de sofrimento, pois perdeu sua família em Hiroxima, e por isso mesmo conhecedor do poder embriagante da lamentação, a tira bruscamente da espiral lamentativa na qual ela se afundava, estapeando-a. E ela agradece-o, verdadeiramente.

E motivos justos para lamentar não nos falta. Assim como ninguém é privado do amor, também ninguém é privado do sofrimento. Qual não é a tentação de se afundar na lamentação e sentir-se justificado em todas as dificuldades? Qual não é o conforto de se achar um culpado que não seja eu mesmo para meus problemas?

Mas não podemos esquecer que temos a opção. Está ao alcance de nossas mãos recuperar nossa soberania, tatear com cuidado o nosso amigo tempo e escolher o amor. O poeta Czeslaw Milosz inspira-nos nessa direção.

“Só agora estou sadio, e era doente, porque meu tempo galopava e afligia-me o medo do que viria.
Sentindo fisicamente, ao alcance da mão, cada momento, amanso o sofrimento e não suplico a Deus que queira afastá-lo de mim:
por que o afastaria de mim se não o afasta dos outros?
Sonhei que me encontrava numa estreita borda sobre o oceano
onde se viam nadando enormes peixes marítimos.
Tive medo que se olhasse, cairia. Virei então,
agarrei-me nas asperezas da parede rochosa,
e movendo-me lentamente, de costas para o mar, cheguei
a um lugar seguro.
Eu era impaciente e irritava-me a perda de tempo com coisas triviais
incluindo entre elas a faxina e a preparação da comida. Agora
corto com cuidado a cebola, espremo os limões, preparo
vários tipos de molho.”

(Trechos de “A condição poética” - Berkeley, 1978)

Ou, dito de outra forma, nas palavras de Antônio Cícero.


Presente
Por que não me deitar sobre este
gramado, se o consente o tempo,
e há um cheiro de flores e verde
e um céu azul por firmamento
e a brisa displicentemente
acaricia-me os cabelos?
E por que não, por um momento,
nem me lembrar que há sofrimento
de um lado e de outro e atrás e à frente
e, ouvindo os pássaros ao vento
sem mais nem menos, de repente,
antes que a idade breve leve
cabelos sonhos devaneios,
dar a mi mesmo este presente?








terça-feira, 16 de abril de 2013

Da felicidade ao alcance de nossas mãos



No nosso cotidiano temos que escolher se vamos privilegiar as estruturas da atividade ou as estruturas de poder, se vamos entrar no movimento da vida ou optar por tentar usar a vida instrumentalmente, via manipulação.

Ao alcance de nossas mãos o possível se apresenta. Mas temos que optar por ele. E abrir mão das miragens que se mostram no horizonte distante, contaminadas pelo ideal. Ou, nas palavras do poeta:


OS DEGRAUS

Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...

Mario Quintana - Baú de Espantos

Que opta pelas estruturas da atividade afeiçoa-se ao aperfeiçoar-se. Sabe-se hoje um pouco melhor que ontem e um pouco pior que amanha. Há pessoas que não conseguem dizer essa frase. Num automatismo supersticioso não podem dizer que ficaram piores que alguma coisa. Existem também pessoas tão lamentadoras que só diriam que “hoje estou um pouco pior que ontem e um pouco pior que amanha”, na convicção de que sempre vai piorar.

Quem opta pelas estruturas da atividade é palmeiro, vai palmo a palmo tateando a realidade, tal como o homem, único animal a engatinhar, uma vez que os macacos não se movimentam sobre as palmas das mãos, mas sobre os nós dos dedos.

É próprio do humano ser palmeiro, mas tentamos negar nossa humanidade buscando o ideal, o perfeito, o sem erro. Ser humano é errar. E, se der, aprender algo com isso.

Guimarães Rosa escreve em certo livro “O princípio de toda maior bobagem é um se prezar demais o próprio da própria pessoa”.

Ou, como diria o capetão maior, no final do filme “O advogado do diabo”:
- A vaidade é meu pecado predileto!

Segundo Alceu Amoroso Lima a soberba é o maior dos pecados. Ela é a a busca indevida do divino enquanto perfeito. E seria a origem de todas as outras formas de perda da humanidade de cada qual, na busca de uma onipotência divina. Esse tipo de autodivinação do humano seria, ainda segundo esse autor, um tipo de antropocentrismo e de negação de deus. É um pecado mascarado pelo fato de que nenhum soberbo se julga soberbo e está de certa forma em todos os pecados, de uma forma disfarçada, essa hipertrofia do amor próprio. “O homem foi feito pra amar e respeitar a si mesmo. Quando trai esse amor por uma paixão idolatra de sua própria onipotência, ou se encobre pela falsa humildade, abre as portas pra soberba. A raiz do pecado é a ignorância de si mesmo.” Seria ainda um pecado simpático e ridículo.

Em relação a esta questão é interessante comparar a etimologia da palavra humildade com a etimologia da palavra humano.

Humildade vem do latim humilìtas,átis , que significa de pouca elevação, de pequena estatura. Humano se origina a partir da palavra latina humánus,a,um, que indica o que é próprio do homem.

Os dois vocábulos têm em comum o prefixo HUM, do latim húmus, significa terra, solo. Humilde nesse sentido indica o que permanece na terra, não se eleva da terra, aquilo que é humilde, de baixa estatura e por isso mesmo próximo ao solo. E Humano indica por sua vez habitante da terra, por oposição primeiro aos deuses, depois aos outros seres.

É de se notar que as duas palavras, humilde e humano, têm a mesma cognação, ou seja, vem de uma mesma raiz. Isso sugere uma íntima correlação entre os termos. Poderíamos então imaginar, em virtude desta correlação, que humano e humilde são termos irmãos. E poderíamos até nos arriscar a dizer que seria próprio do humano a humildade, o saber-se próximo do chão, o saber-se finito e limitado. E por ser assim incompleto o ser humano encontra o seu próprio mistério, que é ser um ser de aprendizagem, um ser que se constitui na aprendizagem durante toda a sua vida, nunca chegando a estar pronto.

Mas negamos essa condição de humanos aprendizes, e almejando a perfeição - perfeição esta inumana por definição - vivemos numa busca desesperada do sucesso, do não falhar, do chegar, ver e vencer absolutos. E assim vivemos prisioneiros da vaidade e da soberba, com pressa, medo e desesperança.

Qual seria a saída da vaidade e da soberba?

Guimarães Rosa faz uma sugestão ao dizer no seu livro “Tutaméia”, no conto “Aletria e hermenêutica” que “Se o tolo admite, seja nem que um instante, que é nele mesmo que está o que não o deixa entender, já começou a melhorar em argúcia.”

Parece sugerir assim a saída socratiana do auto-conhecimento.

Talvez uma outra forma de abordar o problema fosse reconsiderar um termo em desuso: a palavra lhaneza.

Lhaneza é a qualidade do que é lhano e afável. Indica candura, singeleza. Vem do espanhol, e junta em si os fundamentos da franqueza e da simplicidade. Lhano é aquele que é movido pela franqueza, que é franco, sincero, natural e verdadeiro. E o é de maneira simples, singela, amável e despretensiosa.

Lhano se opõe tanto ao afetado e ao fingido e rebuscado, como também ao tosco, ao presunçoso, ao ardiloso, ao vaidoso e ao soberbo.

Lhaneza seria a ponte entre a simplicidade e a verdade, entre a sinceridade e a delicadeza. Aquilo que é lhano consegue tudo dizer, com força e franqueza, sem afetação, fingimento, ardil, presunção ou rebuscamento.

Na “lhanidade” recuperamos a simplicidade e a naturalidade de uma contaminação pela infantilidade. Na “lhanidade” o ser bom nada tem a ver com o ser bobo, inocente ou pueril..

Ou, ainda retornando ao Rosa, “Falava-se de uma ternura perfeita, ainda nem existente; o bem-querer sem descrença.”

Seria possível uma humildade terna, lhana, sem descrença? Uma mansidão de espírito povoada de amor? Conceda-me um pouco, meu deus?

A esperança só pode viver na casa do presente. A esperança vive até onde nossas mãos alcançam. A esperança tem em si a humildade do saber esperar. Com calma e mansidão.

Enfim, o que você já fez neste dia, nesta semana, para você mesmo, na direção dos seus projetos mais vitais? A quanto tempo você não come seu prato predileto? Você já deu um beijo em alguém que ama hoje?

Finalizando, de novo com Mario Quintana, que mostra de maneira poética como a felicidade está sempre bem perto de nós.



DA FELICIDADE

Quantas vezes a gente, em busca da ventura,

Procede tal e qual o avozinho infeliz:

Em vão, por toda parte, os óculos procura

Tendo-os na ponta do nariz!





Poesia anonima, sempre colhida por Ricardo Fenati

Da fonte de sempre (como não anotei, cito de memória):



Trilogia 

Veio primeiro a inocência com que fomos agraciados.
Em seguida, o tempo de nos erguermos em meio à inesperada solidão.
Deus, Deus mesmo, começa muito depois.




Mais uma, da mesma fonte:




Um não é o outro.

O silenciado, não. Aí é a palavra oprimida, impedida.
O silêncio sim, é a palavra operosa que reconhece o seu limite.

ATITUDE RACIONAL



Rir, não lamentar, não odiar o mal, mas compreender e agir exigitivamente.

(Ligeiramente adaptado sobre original de Espinosa.)

terça-feira, 9 de abril de 2013

Mark Twain



Quando estava com catorze anos, meu pai era tão ignorante que eu mal podia suportar a presença do velho. Porém, quando cheguei aos 21, fiquei atônito com o quanto ele aprendera em sete anos. 

segunda-feira, 8 de abril de 2013

ALEXTIMIA




Fonte: Revista Viver - Mente e Cérebro, número 143


Representam 15% d população, são pessoas taciturnas, de coração grande e portadores de uma grossa carapaça.

Têm dificuldade em estabelecer laços, em identificar-se como o que os interlocutores sentem, em perceber quais reações seu discurso provoca neles. No meio familiar, diante de algum conflito, essas pessoas mudam de assunto ou se isolam. Numa situação tensa demais, caem em lágrimas ou explodem em cólera, unica expressão de que são capazes. Deparam com um imenso vazio quando se trata de falar de ternura, ciúme ou desconfiança. Nunca soltam a imaginação, não sabem precisar se estão tristes ou com raiva, preferem tomar uma providência concreta em vez de discutir um problema de relacionamento.

Dá pra encaixar muita gente nessa classificação...

Questionário de TDAH para adultos


O questionário abaixo é denominado ASRS-18 e foi desenvolvido por pesquisadores em colaboração com a Organização Mundial de Saúde. Esta é a versão validada pelo GEDA – Grupo de Estudos de Déficit de Atenção da UFRJ.

IMPORTANTE: Lembre-se que o diagnóstico definitivo só pode ser fornecido por um profissional.

Marque um X no espaço que melhor descreve você nos últimos 6 meses (só marque 1 resposta em cada linha)
                                                                             

Nem um pouco
Só um pouco
Bastante
Demais
1. Com que freqüência você deixa um projeto pela metade depois de já ter feito as partes mais difíceis?                                                                          




2. Com que freqüência você tem dificuldades para fazer um trabalho que exige organização?                                                                          




3. Com que freqüência você tem dificuldade para lembrar de compromissos ou obrigações?                                                                             




4. Quando você precisa fazer algo que exige muita concentração, com que freqüência você evita ou demora para começar?                                                                          




5. Com que freqüência você fica se mexendo na cadeira ou balançando as mãos ou os pés quando precisa ficar sentado(a) por muito tempo?                                                                                    




6. Com que freqüência você se sente ativo(a) demais e necessitando fazer coisas, como se estivesse “ligado na tomada”?                                                                                




Parte A




7. Com que freqüência você faz erros por falta de atenção quando você tem de fazer algo chato ou difícil?                                                                    




8. Com que freqüência você tem dificuldade para manter a atenção quando está fazendo algo chato ou repetitivo?                                                                      




9. Com que freqüência você tem dificuldade para se concentrar no que as pessoas dizem, mesmo quando elas estão falando diretamente com você?                                                                        




10. Com que freqüência você coloca as coisas fora do lugar ou tem de dificuldade de encontrar as coisas em casa ou no trabalho?                                                                           




11. Com que freqüência você se distrai com atividades ou barulhos a sua volta?                                                                             




12. Com que freqüência você se levanta da cadeira em reuniões ou em outras situações onde se espera que você fique sentado(a)?                                                                             




13. Com que freqüência você se sente inquieto(a) ou agitado(a)?                                                                              




14. Com que freqüência você tem dificuldades em sossegar e relaxar quando tem tempo livre para você?                                                                              




15. Quando você está conversando, com que freqüência você se pega terminando as frases das pessoas antes delas?                                                                               




16. Com que freqüência você tem dificuldade para esperar nas situações onde cada um tem a sua vez?                                                                       




17. Com que freqüência você se pega falando em excesso em situações sociais?                                                                                    




18. Com que freqüência você interrompe os outros quando eles estão ocupados?                                                                              





Parte B


Comece pela parte A (seis questões), que serve como um instrumento de “rastreio”.
Se houver pelo menos 4 itens marcados nas áreas bastante ou demais, existe uma chance de se ter TDAH e deve-se proceder aos demais itens (de 7 a 18).

Como avaliar:

Se os itens de desatenção (1 a 4 e 7 a 11) têm respostas marcadas nas áreas bastante ou demais existem mais sintomas de desatenção que o esperado num adulto.

Se os itens de hiperatividade-impulsividade (5 a 6 e 12 a 18) tem respostas marcadas nas áreas bastante ou demais existem mais sintomas de hiperatividade-impulsividade que o esperado num adulto.

O questionário ASRS-18 é útil para avaliar apenas o primeiro dos critérios (critério A) para se fazer o diagnóstico. Existem outros critérios que também são necessários.


IMPORTANTE: Não se pode fazer o diagnóstico de TDAH apenas com o critério A! Veja abaixo os demais critérios.

CRITÉRIO A: Sintomas (vistos acima)

CRITÉRIO B: Alguns desses sintomas devem estar presentes desde precocemente (antes dos 7 ou 12 anos).

CRITÉRIO C: Existem problemas causados pelos sintomas acima em pelo menos 2 contextos diferentes (por ex., no trabalho, na vida social, na faculdade e no relacionamento conjugal ou familiar).

CRITÉRIO D: Há problemas evidentes por conta dos sintomas.

CRITÉRIO E: Se existe um outro problema (tal como depressão, deficiência mental, psicose, etc.), os sintomas não podem ser atribuídos exclusivamente a ele.