segunda-feira, 12 de maio de 2014

MARCHA FORÇADA - poema de Miklós Radnóti

Durante a segunda grande guerra o poeta húngaro Miklós Radnóti (1909-44) foi detido no campo de concentração de Bor, localizado na atual Sérvia. Já perto do fim da guerra, quando os nazistas tiveram que fugir, Radnóti foi enviado em marcha forçada de volta para a Hungria. Mas não chegou ao seu país. Foi executado, como outros tantos, no caminho.
Quando seu corpo foi retirado de uma vala comum e exumado encontraram no bolso de seu casaco um caderno de notas. Os textos ali escritos foram publicados, mais tarde, por sua viúva, Fanni Gyarmati (1912-2014). Este é um desses poemas.



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MARCHA FORÇADA

Louco quem da terra morto se levanta e de novo se arrasta,
e com a dor do nômade movimenta tornozelos e joelhos,
e ainda assim se põe a caminho, como se alçado por asas,
e as valas o chamam em vão, não tem coragem de ficar,
e se você perguntar, por que não? talvez ele responda
que a mulher espera por ele e uma morte mais bonita, mais sábia.
Embora o crédulo esteja louco, porque lá sobre os lares
há muito apenas voam cinzas
a parede da casa desabou, o pé de ameixa se partiu,
e de medo é tormentosa a noite da terra natal.
Oh, se eu pudesse acreditar: que não é apenas no coração que eu levo
tudo que ainda vale a pena, e que existe uma casa à qual voltar;
se ainda existisse! e como em outros tempos na antiga varanda fresca
zumbisse a colmeia da paz, enquanto resfriava a geleia de ameixa,
e o silêncio do final de verão se banhasse ao sol nos jardins sonolentos,
em meio à folhagem frutas pendessem nuas,
e Fanni me esperaria loira diante da cerca vermelha
e lentamente escreveria sombra a lenta manhã, -
mas talvez ainda possa acontecer! A Lua está tão redonda!
Não prossiga, amigo, grite comigo! e vou me levantar!


BOR, 1944, 15 DE SETEMBRO